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Analgesia por infusão contínua em equinos

Escrito por: Carolina Akel e Adriano Carregaro

A analgesia por infusão contínua em equinos tem sido bastante empregada, especialmente em procedimentos clínicos e cirúrgicos nessa espécie. Essa administração busca manter praticamente constante a concentração plasmática do medicamento, promovendo analgesia satisfatória, principalmente no transanestésico e no pós-imediato, melhorando a qualidade da recuperação anestésica.

Diferentes classes de medicamentos podem ser administradas para promover analgesia por infusão contínua (Constant Rate Infusion – CRI), sendo que as mais utilizadas em equinos são os agonistas alfa-2 adrenérgicos, opioides, a lidocaína e a cetamina. Esses fármacos podem ser administrados isoladamente ou em associações, constituindo um protocolo multimodal que potencializa os efeitos analgésicos dos fármacos com diferentes mecanismos de ação.

De maneira geral, essas infusões contínuas de analgésicos promovem redução do requerimento de anestésicos gerais utilizados na manutenção anestésica e, consequentemente, reduzem os possíveis efeitos adversos desses medicamentos. A seguir destacamos as principais taxas de infusões contínuas recomendadas para equinos, podendo ser ajustadas de acordo com o plano anestésico do animal e o estímulo cirúrgico.

Agonistas alfa-2 adrenérgicos

Os agonistas de receptores alfa-2 adrenérgicos são amplamente utilizados na medicina veterinária em grandes animais, por serem considerados ótimos sedativos e analgésicos, além de promoverem relaxamento muscular adequado.

Xilazina: É o agonista alfa-2 mais utilizado em equinos, ainda que seja o fármaco com menor seletividade aos receptores alfa-2 dessa classe. O rápido metabolismo e curto período de ação permite que esse medicamento seja muito utilizado para o controle da dor em equinos equinos nos casos em que ela não deve ser mascarada por longos períodos. Também pode ser administrada em infusão contínua para promover analgesia em procedimentos clínicos ou cirúrgicos realizados com o animal em posição quadrupedal, além de ser o principal agonista alfa-2 utilizado em protocolos de triple drip.

Detomidina: Também pode ser administrada na forma de infusão contínua em equinos. Essa infusão é utilizada principalmente para proporcionar analgesia e sedação em cirurgias com o paciente em estação, especialmente para procedimentos odontológicos e oftalmológicos. O efeito sedativo e analgésico da detomidina é mais interessante e mais prolongado que a xilazina devido a maior seletividade aos receptores alfa-2. Devemos lembrar que quanto maior a seletividade ao receptor, maior a potência e menor a dose administrada para obtenção do mesmo efeito analgésico. Além disso, há maior redução do requerimento de anestésicos inalatórios em relação a infusão com xilazina.

Dexmedetomidina: É o fármaco com maior seletividade por receptores alfa-2, apresentando melhor efeito analgésico em comparação aos outros medicamentos dessa classe. Embora promova maior efeito poupador de anestésico inalatório em relação aos outros agonistas e apresente um bom perfil farmacocinético, como meia-vida de eliminação curta e rápida redistribuição, esse medicamento ainda tem seu uso pouco difundido em grandes animais devido ao elevado custo.

MedicamentoBolusTaxa de infusão
Xilazina0,25 mg/kg1 mg/kg/h
Detomidina0,02 – 0,04 mg/kg7 – 22 µg/kg/h
Dexmedetomidina3 – 5 µg/kg1 – 1,75 µg/kg/h

Os possíveis efeitos adversos dos agonistas alfa-2 estão relacionados principalmente ao sistema cardiovascular, como bradicardia em decorrência do aumento da resistência vascular periférica (hipertensão), podendo gerar até bloqueios atrioventriculares. Também podemos notar hipomotilidade intestinal, aumento na diurese, hiperglicemia, sialorreia, sudorese e tremores musculares.


Lidocaína

É um dos principais adjuvantes analgésicos administrados por infusão contínua em equinos. A lidocaína produz analgesia visceral e somática, podendo aliviar a dor associada à distensão gástrica em casos de cólica e a dor proveniente de laminite. Ela é bastante utilizada em equinos com cólica, pois melhora a motilidade intestinal (efeito procinético), além de reduzir o consumo de anestésicos inalatórios e, consequentemente, seu efeito hipotensor durante a anestesia. Outra particularidade interessante da lidocaína é em relação aos seus efeitos anti-inflamatórios devido a atuação em células polimorfonucleares.

MedicamentoBolusTaxa de infusão
Lidocaína1,3 a 1,5 mg/kg (administrado em 5 – 10 minutos)3 – 6 mg/kg/h

Os possíveis efeitos adversos estão relacionados ao efeito cumulativo da lidocaína. A superdosagem desse medicamento causa principalmente toxicidade do sistema nervoso central e cardiovascular, causando ataxia, sonolência, convulsões, nistagmo, bradicardia e hipotensão. Assim, deve-se utilizar taxas de infusões adequadas e evitar o uso prolongado desse fármaco.


Opioides

Os opioides possuem posição de destaque no combate à dor aguda moderada a grave. Os efeitos farmacológicos desses medicamentos ocorrem através da atuação em receptores opioides específicos, que são encontrados em maior abundância no SNC.

Morfina: Antigamente havia grande relutância do uso da morfina em equinos devido aos efeitos adversos causados pelos seus metabólitos. A morfina, de fato, interfere na motilidade intestinal, principalmente em doses elevadas, porém não há evidências científicas que a correlacione com a cólica pós-operatória. Destaca-se que a infusão contínua de morfina não promove efeitos excitatórios ou alterações fisiológicas quando utilizado como adjuvante analgésico em doses adequadas. Além disso, promove recuperação anestésica melhor e mais tranquila.

Metadona: É um opioide sintético que possui ação agonista em receptores µ (mu) e também nos receptores N-metil D-aspartato (NMDA). A administração desse fármaco por infusão contínua pode ser utilizada em equinos para promover analgesia em procedimentos cirúrgicos com o animal em estação, por exemplo em procedimentos odontológicos, e em animais com sinovite em membros torácicos. Clinicamente observa-se que os animais ficam mais sedados quando recebem metadona por CRI, quando comparados aos que recebem morfina por CRI.

Butorfanol: É um opioide agonista dos receptores k (kappa) e antagonista de receptores µ (mu), sendo ainda bastante utilizado como infusão contínua em equinos. Porém, destaca-se que o butorfanol, sendo um opioide agonista-antagonista, promove menor efeito analgésico em relação aos agonistas totais, por ter efeito teto. Por esse motivo, os agonistas-antagonistas não são indicados como primeira escolha para o tratamento de dores de alta intensidade.

MedicamentoBolusTaxa de infusão
Morfina0,15 mg/kg0,05 – 0,1 mg/kg/h
Metadona0,25 mg/kg0,1 – 0,2 mg/kg/h
Butorfanol25 µg/kg13 – 25 µg/kg/h

Além do efeito analgésico e sedativo esperado com o uso de opioides, podemos observar efeitos indesejáveis, especialmente hipomotilidade gastrointestinal e depressão respiratória. Além disso, em doses elevadas ou infusões de longa duração é possível observar tremores musculares, hipertermia e sudorese, movimentos estereotipados, aumento da atividade locomotora e excitação.


Cetamina

A cetamina também pode ser administrada na forma de infusão contínua para promover analgesia transoperatória ou em procedimentos com o animal em estação. Essa analgesia ocorre principalmente pelo bloqueio não competitivo aos receptores NMDA localizados na medula espinhal. Destaca-se que a analgesia da cetamina, por infusão contínua, é de menor intensidade quando comparada aos outros medicamentos já destacados nesse post, sendo interessante como um adjuvante extra à infusão contínua.

MedicamentoBolusTaxa de infusão
Cetamina0,5 mg/kg0,6 – 1,2 mg/kg/h

Como efeitos indesejáveis, deve-se atentar à hipomotilidade quando a cetamina for utilizada como CRI. Também podemos observar alguns efeitos relacionados principalmente ao SCN, como excitação e alterações comportamentais em animais conscientes, como mudanças de apoio, ataxia e desorientação, mas que só ocorrem em doses elevadas.


CONCLUSÃO

Podemos ver que a infusão contínua de diferentes medicamentos e suas combinações também podem ser realizadas em equinos. Essa manobra promove excelente analgesia perioperatória, reduzir o requerimento de anestésicos gerais e, consequentemente, promover melhor recuperação anestésica. Porém, devemos ficar atentos a possíveis efeitos indesejáveis podem aparecer e devem ser controlados com o ajuste das taxas de infusões ou até mesmo pelo uso de reversores, como a naloxona (para opioides) e o atipamezole (para agonistas alfa-2).

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Pra ler depois:

Aguado et al. Reduction of the minimum alveolar concentration of isoflurane in dogs using a constant rate of infusion of lidocaine–ketamine in combination with either morphine or fentanyl. Vet J, 189: 63-66, 2011.
Gutierrez-Blanco et al. Evaluation of the isoflurane‐sparing effects of fentanyl, lidocaine, ketamine, dexmedetomidine, or the combination lidocaine‐ketamine‐dexmedetomidine during ovariohysterectomy in dogs. Vet Anaesth Analg, 40: 599-609, 2013.
– Gutierrez-Blanco et al. Postoperative analgesic effects of either a constant rate infusion of fentanyl, lidocaine, ketamine, dexmedetomidine, or the combination lidocaine‐ketamine‐dexmedetomidine after ovariohysterectomy in dogs. Vet Anaesth Analg, 42: 309-318, 2015.
Hermanns et al. Molecular mechanisms of action of systemic lidocaine in acute and chronic pain: a narrative review. British J Anaesth, 123: 335-349, 2019.
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