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Farmacologia dos Anestésicos Locais – Anestesia é o Básico #20

Olá tripulantes do NAVE, tudo bem? Nessa videoaula da webserie Anestesia é o Básico nós conversar sobre a Farmacologia dos Anestésicos Locais, que compõe uma das modalidades anestésicas mais seguras que temos, a Anestesia Locorregional.

Após o advento da Anestesia Inalatória, em 1846, a utilização de substâncias que promovem anestesia local foi um dos grandes saltos na História da Anestesia. Na verdade, a anestesia local teve origem centenas de anos antes, com os povos andinos, que utilizavam as folhas de coca em seus rituais. Em 1855 os químicos já conseguiam extrair a cocaína das folhas de coca e eles já percebiam que ela dava certa dormência na língua. Porém, apenas em 1884 a cocaína foi utilizada oficialmente como anestésico local, pelo Dr. Carl Koller, para insensibilizar a córnea em cirurgias oftálmicas. Porém, devido seus efeitos indesejáveis, principalmente psicotrópicos e cardiovasculares, o uso da cocaína foi descontinuado.

Depois disso vários anestésicos locais foram sintetizados, mas a qualidade da anestesia local só mudou após a síntese da lidocaína, em 1948. Ela foi o primeiro anestésico local derivado de amida e essa característica deu maior estabilidade à molécula e a não produção do ácido para-aminobenzoico (PABA), sendo então menos alergênica.

Mecanismo de Ação

Os anestésicos locais são substâncias que bloqueiam a condução nervosa de forma reversível, por bloqueio dos canais de sódio nas fibras aferentes. Para que isso ocorra, a anestésico local precisa penetrar a camada fosfolipídica, chegar à porção interna do axônio e assim, impedir a troca de íons pelos canais de sódio. Uma informação importante que precisamos lembrar é que os anestésicos locais são bases fracas. Assim, nós vamos ter a forma molecular, que é neutra e penetra facilmente a membrana fosfolipídica, e a forma protonada (carregada eletricamente), que não tem como penetrar na membrana.

Nesse caso, o que temos é que a forma neutra passa a camada fosfolipídica e chega à porção interna da célula. Porém, essa relação entre formas moleculares e protonadas também tende a se manter no interior celular e isso é muito importante, pois quem tem a característica de bloquear o canal iônico é a forma protonada, impedindo a repolarização celular.

Mecanismo de ação dos anestésicos locais. A forma molecular (B), que é neutra, penetra a camada fosfolipídica. Parte dessas moléculas se ligam a um próton, para manter o equilíbrio entre as formas. Nesse caso, a forma protonada, ou seja, carregada (BH+), é que tem a capacidade de bloquear os canais de sódio.

Sequência de Bloqueio

A velocidade de bloqueio é dependente da anatomia da fibra. As primeiras fibras a serem bloqueadas são as fibras C (finas e não mielinizadas) e Adelta (finas e mielinizadas), responsáveis principalmente pelos estímulos de dor e temperatura. Depois, há o bloqueio das fibras Abeta e Aalfa, que são mais grossas e mielinizadas e responsáveis pelas sensações de tato, pressão e propriocepção. Assim, a ordem crescente de bloqueio é sequenciada, ocorrendo a perda da sensação de dor, calor, tato, pressão profunda e por fim, a motora. A volta da sensibilidade segue a sequência inversa.

Tipos de fibras sensoriais, de acordo com a espessura, velocidade de transmissão e tipo de receptores.

Principais anestésicos

Atualmente, há um número razoável de anestésicos locais, cada qual com uma característica diferente. Na medicina veterinária são utilizados basicamente a lidocaína, bupivacaína e ropivacaina.

– Lidocaína: Ainda é o anestésico mais utilizado na veterinária, principalmente por conta da sua versatilidade. Ela é utilizada não só para bloqueios locorregionais, mas também como antiarrítmico (1 – 2 mg/kg, IV) e analgésico, nesse caso, administrado por infusão intravenosa contínua. As taxas de infusão podem ser consultadas no video.
– Bupivacaína: É um anestésico local de longa duração, promovendo anestesia por mais de 6 horas. Porém, também tem período de latência prolongado, por volta de 20 minutos, e toxicidade maior que a lidocaína. Uma característica interessante da bupivacaína é que ela promove bloqueio total das fibras sensitivas, C e Adelta, mas não das fibras Abeta. Então, o paciente mantem certa autonomia motora, o que pode ser interessante em alguns casos.
– Ropivacaína: Tem praticamente as mesmas características da bupivacaína, em período de latência, de ação e características de bloqueio. Porém, é um pouco mais segura em relação aos efeitos tóxicos.

Cabe lembrar que a efetividade do bloqueio depende de vários fatores. Os principais são o volume administrado, lipossolubilidade, concentração da solução e o uso de vasoconstritor. Nesse caso merecem destaque a concentração, que quanto maior, menor será o período de latência e mais prolongada será a anestesia, e o uso do vasoconstritor, que aumenta em aproximadamente 50% o período de ação. Destaca-se porém que o uso de anestésico local com vasoconstritor é proibido em extremidades, pois pode causar necrose.

Toxicidade

Apesar da anestesia local ser considerada uma das modalidades anestésicas mais seguras, há algumas possibilidades de complicações. Por isso devemos sempre saber qual a dose máxima dos anestésicos locais para cada espécie. Geralmente não precisamos usar tanto anestésico, mas precisamos adequar o volume com uma boa margem de segurança, a fim de realizar a técnica locorregional e evitar qualquer possibilidade de intoxicação sistêmica. Os principais sinais de intoxicação são referentes ao sistema nervoso central, promovendo depressão, ataxia, ansiedade, convulsões, inconsciência, coma e até choque bulbar, e cardiovascular, promovendo depressão do miocárdio.

Veja as informações com detalhes no vídeo!


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– Bruchim et al. Evaluation of lidocaine treatment on frequency of cardiac arrhythmias, acute kidney injury, and hospitalization time in dogs with gastric dilatation volvulus. J Vet Emerg Crit Care, 22:419-427, 2021.
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