ECG na ANESTESIA – NAVE Ondas #4
A eletrocardiografia, também conhecida como ECG, é certamente a monitoração gráfica mais antiga que temos. Ela surgiu no início do século XX, enquanto que a avaliação da onda de pressão arterial foi iniciada na década de 1920 e a capnografia e oximetria no início dos anos de 1970. O primeiro registro de traçado eletrocardiográfico data de 1902, obtido pelo fisiologista holandês Willem Einthoven. O aparelho pesava quase 300kg e, ainda que totalmente diferente dos modelos que temos hoje, já gerava um traçado de excelente qualidade.
O ECG é, na verdade, uma composição de várias ondas sequenciadas, que representam a atividade elétrica gerada pelo coração em um batimento. Para entendermos como obter esse traçado, precisamos lembrar que o coração é um músculo com condução elétrica ritmada e, desde que esteja saudável, sempre vai gerar um primeiro estímulo em um determinado lugar, para aí então propagar para outras partes do órgão.
O estímulo inicial é disparado no nó sinoatrial, localizado no átrio direito. Após isso, o estímulo segue em direção ao nó atrioventricular, que conduz o estímulo para os ventrículos, pelo feixe de Hiss, localizado no septo interventricular. Esse então segue caminho, chegando até as fibras de Purkinje, formando as ondas do eletrocardiograma.
Onda de ECG Padrão
Para obtermos as ondas de ECG na anestesia, geralmente utilizamos as derivações bipolares de Einthoven, que são a DI (braço direito – braço esquerdo), DII (braço direito – perna esquerda) e DIII (braço esquerdo – perna esquerda). Há outras derivações, como a aVR, aVL, aVF e as precordiais, que também são importantes em uma avaliação mais detalhada do coração. Porém, a interpretação do ECG durante a anestesia é bem mais dinâmica que na clínica médica, isso porque fazemos uma leitura mais rápida, sem medir tamanho de ondas e tentando correlacionar o traçado com os medicamentos utilizados ou acontecimentos durante a anestesia.
O ECG padrão tem o seguinte formato: A primeira onda é a P, que caracteriza a despolarização dos átrios e é positiva. Depois temos o complexo QRS, que caracteriza a despolarização dos ventrículos. Em sequência temos a onda T, que representa a repolarização dos ventrículos, geralmente é positiva e com tamanho máximo de 25% da onda R. É importante entendermos que a onda gerada pela repolarização dos átrios geralmente não é observada, pois ela é sobreposta pelo complexo QRS.
Em equinos e bovinos nós utilizamos a derivação base-ápice, que nos dá uma leitura um pouco diferente, com o complexo QRS invertido. A onda T pode ser positiva ou bifásica. Um outro detalhe bem importante é que a onda P pode ser bífida em equinos adultos, devido o tamanho dos átrios.
Alterações nas Ondas de ECG
Há uma gama de alterações na onda de ECG, dezenas delas, sendo que algumas arritmias são bem evidentes, outras muito sutis. Nessa videoaula nós vamos abordar as principais alterações nas ondas de ECG durante a anestesia. Destacamos que todas as figuras abaixo foram obtidas do site ecg-educator.blogspot.com , de propriedade de Jason Winter. Lá nós podemos encontrar dezenas de traçados diferentes, todos com explicações bem detalhadas.
Bradicardia Sinusal: A frequência cardíaca está abaixo do padrão para o indivíduo, mas a morfologia das ondas está normal, com os intervalos R-R regulares e preservação do intervalo P-QRS.
Parada Sinusal (Sinus arrest): Isso ocorre quando temos um traçado normal, com onda P seguida do complexo QRS e onda T, todas com morfologia normal mas, em algum momento há uma pausa, gerando um intervalo R-R maior do que o dobro do normal.
Bloqueio atrioventricular: Também chamado de BAV, essa arritmia cardíaca ocorre quando o intervalo entre a onda P e o complexo QRS aumenta. Nesse caso, há uma lentificação do disparo do nó atrioventricular. Pode ocorrer apenas um retardo no intervalo P-Q, conhecido como BAV de 1º grau ou até a necessidade de um novo disparo do nó sinoatrial, gerando um BAV de 2º (ao lado) ou 3º graus.
Taquicardia Sinusal: A frequência cardíaca está acima do padrão para o indivíduo, mas a morfologia das ondas está normal, com os intervalos R-R regulares e preservação do intervalo P-QRS.
Complexo Ventricular Prematuro: O disparo do batimento cardíaco não ocorre pelo nó sinusal, muito menos pelo nó atrioventricular. Há uma despolarização com origem em uma outra região do ventrículo, gerando um traçado sem onda P e com complexo QRS de característica bizarra. Caso ocorram vários CVP em sequência, dá-se o nome de taquicardia ventricular.
Complexo Atrial Prematuro: Há despolarização dos átrios por um foco anormal, que não o nó sinoatrial. Isso gera contração atrial juntamente com a despolarização dos ventrículos, ou até mesmo antes dele. Há sobreposição da onda P sobre a onda T.
Possíveis interferências na obtenção da onda
O traçado de ECG obtido durante a anestesia é bem confiável e muito útil na monitoração. Entretanto, há algumas interferências que podem nos dar padrões alterados das ondas, mas que não refletem a atividade elétrica cardíaca. Basicamente podemos ter valores de frequência cardíaca errada, caso a morfologia das ondas esteja adequada, gerando ondas P ou T muito altas. O monitor acaba “entendendo” que a onda P, T ou mesmo uma onda bizarra de CVP é na verdade uma onda R, considerando um batimento. Artefatos que geram interferência na leitura também são comuns. Os principais são falta de aterramento do monitor cardíaco, interferência elétrico com o colchão térmico ou mesmo mal posicionamento dos eletrodos no paciente.
Assim, devemos lembrar sempre que a monitoração deve ser a mais completa possível, com outros parâmetros que possam ser correlacionados entre si ou mesmo ratificar os valores que observamos em um tipo de monitoração.
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