O QUE SÃO VASOATIVOS E PARA O QUE SERVEM?
Escrito por: Ana Paula Mazzarella, Felipe Costa e Adriano Carregaro
A necessidade de vasoativos é comum em diversos procedimentos anestésicos. Mas afinal, como esses fármacos agem no organismo? Todos eles têm a mesma função?
É de conhecimento geral que a anestesia afeta o sistema cardiovascular, geralmente causando redução no débito cardíaco. Essa complicação ocorre pois o anestésico pode reduzir a contratilidade cardíaca (inotropismo negativo), diminuir a frequência cardíaca ou mesmo a resistência periférica sistêmica. Um dos efeitos finais desse processo pode ser a queda da pressão arterial, ou seja, hipotensão.
Além da anestesia, outros fatores podem ocasionar hipotensão, como o procedimento cirúrgico quando há perda excessiva de sangue, ou então comorbidades presentes no paciente, como desidratação, problemas cardíacos e infecções diversas.
A abordagem para o tratamento da hipotensão no período transanestésico deve iniciar antes mesmo da escolha de qual vasoativo usar. Nesse caso, devemos ajustar o plano anestésico do paciente, diminuindo o impacto desses medicamentos nos parâmetros cardiovasculares. Também devemos verificar se a reposição volêmica está sendo suficiente, atentando-se especialmente para os casos de desidratação. Nas situações em que não há resolução com essas medidas, é necessário a instituição de tratamento através do emprego de vasoativos.
Vasoativos são divididos em inotrópicos (efeitos cardíacos), vasopressores e vasodilatadores (efeitos vasculares), com atuação nos receptores adrenérgicos regulados pelo sistema nervoso simpático.
Receptores Adrenérgicos | Efeitos |
α1 | Pós-sinápticos, vasoconstrição e ↑ resistência periférica |
α2 | Pré-sinápticos, liberação de norepinefrina |
𝛽1 | Pós-sinápticos, taquicardia e ↑ contratilidade do miocárdio |
𝛽2 | Pós-sinápticos, vasodilatação e ↓ resistência periférica |
VASOATIVOS NÃO SELETIVOS
Os agonistas não-seletivos são fármacos possuem seletividade por mais de um tipo de receptor. Nesta classe, estão:
Dopamina
A dopamina age aumentando a atividade do sistema nervoso simpático, o que resulta em maior liberação de noradrenalina, causando aumento da pressão arterial e da contratilidade do miocárdio. Sua ação é realizada tanto nos receptores alfa, quanto nos receptores beta, porém dependendo da dose, ocorre maior estimulação de um em relação ao outro.
Esse fármaco é considerado dose-dependente, ou seja, seu efeito está relacionado com a dose utilizada. Doses entre 5 e 7 μg/kg/min ativam os receptores beta-adrenérgicos, aumentando a contratilidade do miocárdio. Já doses mais elevadas, entre 10 e 20 μg/kg/min ativam receptores alfa-adrenérgicos, promovendo vasoconstrição periférica e aumento da resistência vascular sistêmica, elevando assim a pressão arterial.
Dobutamina
A dobutamina é um inotrópico com alta seletividade em receptor beta1, aumentando consideravelmente a contratilidade do miocárdio. Sua utilização também é em infusão continua em taxas que variam de 1 a 20 μg/kg/min, sendo indicado nas cardiomiopatias que acometem a contratilidade do miocárdio. Esse medicamento tem pouca afinidade por receptores alfa.
Efedrina
A efedrina atua em todos os receptores adrenérgicos, promovendo taquicardia e aumento de pressão arterial por vasoconstrição periférica. Mas ela também atua nos receptores pré-sinápticos, estimulando a liberação de noradrenalina, intensificando esse efeito. Sua utilização geralmente é feita em bolus de 0,1 a 0,2 mg/kg; por isso geralmente é utilizada quando queremos efeitos de curta duração.
Norepinefrina/Noradrenalina
A norepinefrina é um importante vasopressor, aumentando a resistência vascular e, consequentemente, a pressão arterial, podendo ajudar a melhorar a perfusão sanguínea e a oxigenação dos órgãos e tecidos do corpo. Isso acontece muito devido à intensa estimulação dos receptores alfa adrenérgicos.
Seu uso é indicado nos casos de hipotensão refratária a manobras de reposição volêmica, como por exemplo em pacientes em sepse. Porém, a norepinefrina possui alguns efeitos adversos, a depender da dose, como bradicardia reflexa pelo aumento considerável da resistência vascular periférica, vasoconstrição renal, mesentérica e musculo cutânea acentuada.
Epinefrina/Adrenalina
A epinefrina, ou adrenalina, é utilizada somente em última escolha. Sua atuação é predominante em receptores alfa adrenérgicos, ocasionando intensa vasoconstrição periférica. A vasoconstrição é tão intensa a ponto de reduzir consideravelmente a perfusão periférica e de órgãos esplâncnicos, priorizando a mobilização do volume intravascular para o compartimento central. Sua utilização é mais indicada em casos de parada cardiorrespiratória, iniciando com bolus de 0,01 mg/kg, entre dois e três ciclos de reanimação cardiorrespiratória, e em caso de não responsividade, a dose pode ser elevada para 0,1 mg/kg.
AGONISTAS SELETIVOS
Vasopressina
A vasopressina, também conhecida como hormônio anti-diurético (ADH), é liberada de maneira endógena em situações e estresse fisiológico. Seu uso é indicado para pacientes em sepse não responsiva à norepinefrina. Ela atual nos receptores V1, presentes em abundância nos vasos sanguíneos e responsáveis pelo efeito de vasoconstrição, otimizando a pressão arterial através da melhora na microcirculação.
Ela atua também nos receptores V2, promovendo efeito anti-diurético e em receptores V3, presentes na hipófise, responsáveis pela liberação do hormônio adenocorticotrófico. Sua utilização é sob infusão contínua iniciando-se com uma taxa de 0,001 UI/kg/min e titulando a infusão até a dose máxima de 0,004 UI/kg/min.
Fenilefrina
A fenilefrina possui seletividade apenas com receptores alfa-1, provocando vasoconstrição. Porém, seu uso em situações de hipotensão é o de última escolha, devido sua intensa vasoconstrição periférica e redução do débito cardíaco, promovendo efeitos adversos importantes na perfusão de órgãos essenciais como os rins.
Esmolol
Ainda que esse post seja voltado para o uso de vasoativos para o tratamento da hipotensão, devemos destacar que há outros vasoativos, que podem promover outros efeitos. O esmolol é um desses. Ele é um bloqueador beta adrenérgico indicado para paciente com hipertensão sistêmica em que a redução da frequência cardíaca é desejável, especialmente pacientes com taquicardia ventricular que são refratários ao tratamento com lidocaína. Ele é utilizado em bolus de 0,5 mg/kg seguido de infusão contínua na taxa entre 50 e 200 μg/kg/min.
VASODILATADORES
Os vasodilatadores são pouco utilizados em medicina veterinária, porém, sem deixarmos de lado a sua importante citação dentro dos fármacos classificados como vasoativos. Seu emprego fica restrito a procedimentos bem pontuais e delicados envolvendo pacientes que necessitam passar por algum procedimento cirúrgico cardíaco ou estão em crise hipertensiva associada a hipertensão pulmonar.
Nitroprussiato de Sódio
O nitroprussiato de sódio promove vasodilatação, reduzindo a pós-carga; logo, pode aumentar o débito cardíaco em algumas situações. Seu uso é indicado quando é necessário reduzir rapidamente a pressão arterial, especialmente em procedimento cirúrgicos cardíacos delicados e emergências hipertensivas que cursam com hipertensão pulmonar.
Nitroglicerina
Assim como o nitroprussiato, a nitroglicerina também é um vasodilatador usado em casos de crises hipertensivas e em pacientes com insuficiência cardíaca. Seu mecanismo de ação, assim como o do nitroprussiato, está relacionado na sua conversão para óxido nítrico (NO), uma molécula que desempenha um papel importante na regulação do tônus vascular, causando relaxamento dos músculos lisos vasculares, levando à vasodilatação.
Concluindo
Como vimos, os vasoativos são muito mais que meros medicamentos que aumentam a pressão arterial. Eles não são todos iguais e, o que difere um do outro é o mecanismo de ação e intensidade que se ligarão a cada receptor. Por isso, é importante identificar a causa para fazer a escolha adequada do vasoativo, de maneira a evitar efeitos indesejados na perfusão de determinados tecidos sem a necessidade.
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- Avaliando a Onda de Pressão Arterial – NAVE Ondas #3
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Pra ler depois:
Humm et al. Use of sodium nitroprusside in the anaesthetic protocol of a patent ductus arteriosus ligation in a dog. Vet J, 173:194-196, 2007.
Scroggin Jr et al. The use of vasopressin for treating vasodilatory shock and cardiopulmonary arrest. J Vet Emerg Crit Care, 19:145-157, 2009.
Silverstein et. Controversies regarding choice of vasopressor therapy for management of septic shock in animals. J Vet Emerg Crit Care, 25:48-54, 2015.
Murphy et al. Use of vasopressors for treatment of vasodilatory hypotension in dogs and cats by Diplomates of the American College of Veterinary Emergency and Critical Care. J Vet Emerg Crit Care, 32:714-722, 2022.
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Muito bom, até mesmo eu que não sou da área entendi!!